A autotransformação como mulher foi determinante em meu processo como mãe.

Invoquei a maternidade de maneira consciente. Estava pronta para entregar-me completamente à outra vida humana. Criei um mantra interno: “agora me sinto mulher inteira para conceber, gerar, parir, nutrir e acompanhar a vida de um outro ser humano.”

O Universo traz o homem. Torno-me a guia na profundidade do encontro sexual. O movimento pela unidade corpo – alma. O êxtase na integração macho – fêmea. A energia orgástica do amor dá origem à Laila. A gravidez é vivida em estado de graça. O sexo ultrapassa todas as experiências vividas. Orgasmos radicais e transcendentes. Me sinto um animal sagrado, puro instinto.

Faço um retiro na natureza, a sós com a barriga. Alimento Laila com o silêncio da lua, a alegria dos pássaros, a força do sol, a fluidez das marés, a retidão das montanhas. Ela gosta tanto de meditar que continua sentadinha até chegar do lado de cá! Acato a posição pélvica com total respeito ao seu organismo e direito de nascer naturalmente. Uma prova de fé para meu corpo sagrado de fêmea. Não abro espaço para o medo e a ignorância alheia. Confio no poder que há em mim. E garanto o rito de iniciação para as duas.

A força de Laila para sair do “paraíso” e tornar-se pessoa. A força de Fernanda para ultrapassar as camadas mais profundas de sua história durante o trabalho de parto e tornar-se mãe. Sinto as contrações do útero como um buraco negro do Universo: não dá pra escapar; o tempo para e o espaço deixa de existir. O corpo é tomado por uma força irracional. As contrações chegam ao máximo e o rosto de minha filha aparece três vezes, na distância do tempo em que está para sair. Sou levada à outra dimensão pouco antes de parir.

O macho segura a minha mão. Laila está chegando. Neste momento entram outros médicos, além da obstetra. Se surpreendem ao ver um parto pélvico e começam a disseminar a ignorância.Protejo a mim e a minha filha. Os perdoo. Eles não tem ideia do poder que é ser fêmea e parir.

Quando Laila está em meus braços sinto a paz no mundo. A recebo como guia em meu processo como mãe.
E me entrego 24 horas por dia ao seu desenvolvimento. Com o apoio e respeito da família, vivo a maternidade à minha maneira, absolutamente instintiva e respeitosa ao organismo vivo que é Laila.
Experimento na prática os benefícios de toda minha transformação como pessoa.
Garanto um estado de presença e entrega absolutos para enfrentar os radicais desafios para o corpo e a mente.

A maternidade é a maior escola de ralação de ego. Não há templo, guru ou escritura sagrada que se compare à prática de cada momento vivo e desafiador com um ser puro, recém-nascido, totalmente aberto e dependente, através de suas necessidades orgânicas de sobrevivência e desenvolvimento.

Minha radical entrega à maternidade também é um caminho de prevenção às doenças do mundo. Estou segura de que a concepção, gestação, parto, amamentação e acompanhamento intensivo nos primeiros anos de vida e seguido em presença e consciência são absolutamente fundamentais para a construção da pessoa que minha filha torna-se a cada dia. Ajudar a ser quem ela é, em todo seu potencial de vida, é a missão que tenho como mãe.

Autora: Fernanda Franceschetto

Vulvoscopia FF: A jornada íntima sem tabu

Foto: FF entrando em trabalho de parto, pelo olhar de Iñaki Zapirain

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